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segunda-feira, julho 31, 2006

Microchip

No meu primeiro ano como estudante universitário em Lisboa, como ainda não conhecia muita gente, amigos ou colegas, passava as tardes de fim-de-semana no café da minha rua.

Para quem não conhece, a 'Capucha', de seu nome, também conhecida pelos meus vizinhos por Sr. Carlos (que é o nome do dono), é uma típica tasca com esplanada e tudo! Ali tudo se sabe e toda a gente se encontra. Especialmente ao Domingo que é dia de futebol. E por incrível que pareça, nas tascas, velhos 'com os copos' podem ser bem piores que 'beatas de igreja'... Com a diferença que dão a qualquer conversa um ar sério e sabedor de todo e qualquer assunto que surja.

A título de exemplo, vou partilhar convosco esta pequena história. Estava eu uma bela tarde no Sr. Carlos a beber umas imperiais, enquanto esperava pelo jogo do meu Sporting Clube de Braga, e eis senão quando, aparece o 'Estrela'.

O 'Estrela' era bastante conhecido na rua. Tinha ar de 'carocho', ninguém sabia de onde vinha nem para onde ia. Certamente adepto de actividades duvidosas, mas que no caso dele ninguém duvidava. No entanto era um personagem querido de todos os que habitavam ordinariamente o café do Sr. Carlos.

O 'Estrela' já não aparecia há bastante tempo, pelo que foi motivo de alguma alegria vê-lo de volta e bem de saúde, na medida do possível no caso dele.

- Então 'Estrela', bons olhos te vejam! Por onde tens andado? - perguntou o Sr. Carlos
- Estive a passar férias na herdade de um amigo meu ali para os lados de Setúbal - respondeu o 'Estrela' com ar importante.

Foi gargalhada geral!
-Estiveste foi numa clínica de recuperação...- foi o comentário que, de entre outros, me ficou gravado na memória.

O 'Estrela', ofendido, retorquiu com ar sério:
- Estou a dizer a verdade! E digo mais: vi lá algum que nunca tinha visto antes que vocês nem sonham... - e contou-nos a história dele com um entusiasmo tal que ninguém foi capaz de o interromper - A herdade do meu compadre é enorme. Tem p'raí,... Kilómetros! E tem lá uns cães grandes também, lindos, pretos que andam à solta pelo terreno. A esta altura, ele faz uma breve pausa, como preparando-se para lançar uma bomba... - Mas o que me deixou doido, é que ele tem la um assobio, que por mais que se sopre não se ouve nada. Mas os cães vêm a correr. Vai buscá-la! - diz o 'Estrela' com o seu habitual ar de campeão.

A falta de reacção a esta história foi generalizada. Não sei se pelo fantástico desta história, se pela tamanha ignorância que fazia do 'Estrela' a pessoa mais feliz da rua... E quando menos se esperava, há uma voz que surge de rompante:
- Ah! Eu sei o que isso é. - afirma incontornavelmente um dos velhos e habitués da 'Capucha'. Era o ponto sem retorno. Ele iria mesmo explicar o que era o assobio?... Será que não percebe que iria destruir o momento vitorioso de 'Estrela'? - Isso é um Microchip!

O espanto e a curiosidade foi tal, que todas as pessoas cercaram aquele orador como se merecesse a Presidência da República.

- Aposto que os animais tinham umas coleiras fora do vulgar?...
Ao que o 'Estrela' confirmou:
- Sim. A modos que cheias de brilhantes e chapas metálicas. Eram grossas e tudo.
- E aposto que os animais iam sempre ter ao mesmo sítio?... - continuou o velho na sua tentativa de provar a sua teoria.
- Oh! O meu compadre ia a porta das traseiras e chamava-os e eles vinham.
- Ora cá está! - agora era o velho que envergava o mesmo ar de campeão vitorioso que roubara ao 'Estrela' - É como digo. Isso é um Microchip, que está na coleira do animal, que por sua vez tem um eléctrodo ligado ao cérebro do animal! O assobio, não é mais que aproveitar a energia eólica do sopro, para poupar pilha. Este assobio emite uma micro-onda via rádio, que por sua vez bate no Microchip, enviando um sinal ao cérebro através do eléctrodo. Obviamente que, depois, o animal tem de estar treinado para praticar uma determinada acção, neste caso, ir ter à porta das traseiras do seu compadre. - finaliza o homem já quase sem fôlego, levantando o copo de imperial para molhar a garganta depois de tão eloquente discurso.

Perante tal explicação o espanto foi geral. "É o progresso diziam uns"... O 'Estrela' só conseguiu dizer: "Ah pu** que o fod****"

Apenas uma dúvida resiste. Se os suspiros do 'Estrela' seriam pela explicação dada, ou pelo facto de ter perdido o estrelato depois da intervenção de tal sábio. O velho, esse, mais tarde confirmei que não percebe nada de ultra-sons!

Sofa amarelo

Antes de mais, aqui vai o porquê do nome deste Blog. E também um pequeno tributo à peça material mais marcante de toda a panóplia mobiliária que compõe a meticulosa decoração da minha casa! Embora não pareça, este título tem tudo a ver com o tema deste Blog.

O meu sofá amarelo tornou-se um verdadeiro mito urbano! Confesso que quando o comprei não estava preparado para o que ia acontecer...
Que belo sofá pensei eu, inocente.
Foi preciso o meu amigo Filipe, que morou comigo um semestre, descobrir que o sofá dava para 2,5 cambalhotas (lembras-te?) que eu descobri o potencial daquele sofá. E tem-se revelado um verdadeiro sucesso, fazendo inveja a qualquer individuo desprevenido que nele se sente.
A inveja é tal, que já me disseram: 'O meu sofá novo é melhor que o teu'. Mas depois vem a minha casa visitar-me com a mesma regularidade... podem ser maiores, mais modernos, mais retro, mas ainda está por aparecer o sofá MELHOR que o meu!
Vou-vos dar uns exemplos:

João Ricardo: é meu vizinho e mora no prédio ao lado do meu! Desde que o conheço, ou melhor, desde que ele conhece o sofá, já lá dormiu mais vezes que na própria cama! Às vezes a mãe dele liga-me de manhã preocupada e eu digo-lhe o mesmo de sempre... 'Adormeceu no meu sofá!'

Marmita: o meu amigo Carlos Simões também tem a sua afinidade para com este belo exemplar de mobiliário. Uma certa época de exames foi estudar para minha casa e acabou por ficar um mês a dormir no meu sofá! Dividíamos despesas e tudo...

Fragoso: este será talvez o melhor exemplo! Este alentejano de gema partilhou moradia comigo durante cerca de um ano. Havia noites em que quase discutíamos para ver quem ficaria a dormir no sofá! E normalmente, o primeiro a ter de ir mijar (que só acontecia por volta das 5h00 da madrugada por altura das tele-vendas) , era quem perdia a teima. O derrotado, saía da casa-de-banho, despedia-se com um arrogante 'boa noite' e dirigia-se para a cama de semblante desiludido, mas confiante que na noite seguinte haveria de ganhar!

Obviamente que não vou dar exemplos de raparigas, pois apesar de bem mais interessantes as suas histórias, já não fariam sentido neste Blog. Até porque ninguém adormece quando está no 'bem-bom'. Mas vos garanto que ficaram la até ao dia seguinte!

A 'Fifinha' será talvez a única que terá passado incólume de percalços no mirabolante sofá amarelo! Mas que gostava de o ter em casa não duvido.

Com tal mito residente e desvirtuado de preconceito, mas ao mesmo tempo possuidor de uma malícia extrema, que é capaz de derrotar o mais ávido e enérgico ser, acabo por sair derrotado na minha própria casa. Será que tenho mesmo amigos, ou é o sofá que os atrai?... De qualquer modo ainda bem que o tenho. Se aquele sofá falasse...