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sexta-feira, setembro 08, 2006

O Barbeiro!

Foi há bastante tempo que publiquei o meu último post... Mas ainda foi há mais tempo que me preocupei com a minha imagem, pelo que, a esta data, tenho o cabelo com um comprimento considerável. Por essa razão têm-me sido feitos uns quantos comentários, que apesar de pouco elogiosos têm a sua piada. Os mais engraçados são até alusivos ao futebol:

“Não devias estar em Madrid, Maniche?”
“Para quem não é sportinguista, pareces um leão…”

Acontece que hoje, ao espelho, enquanto confirmava o meu desleixo recente, lembrei-me do meu primeiro barbeiro em Lisboa.

Morava há pouco tempo na Rua Barão Sabrosa, e precisava de cortar o cabelo. Fui à “Capucha”, e junto do Sr. Carlos informei-me sobre o sitio mais perto e/ou mais barato onde cortar o cabelo. Para espanto meu, descobri que na mesma rua, ainda por mim inexplorada, havia “O Barbeiro”. Era assim que era tratado o Sr. que cortava o cabelo a quase toda a “velha-guarda” da Barão!

E lá fui eu! Chegado ao local deparei-me com um verdadeiro “Barbeiro”. Nada de extravagâncias como há agora nesses salões de beleza… E muito menos desses novos ‘estilistas do cabelo’ que nasceram trocados. Uma casa simples, ou melhor, um corredor, um espelho, um balcão, duas cadeiras como nos filmes a preto-e-branco, um calendário com uma mulher nua por mês, e um poster do Belenenses!

O preço de 800 escudos era bastante apelativo, já “O Barbeiro” nem por isso… Um homem nos seus 50/60 anos, Salazarista convicto, denotava uma destreza de mãos só equiparável à graduação que trazia nas lentes dos seus óculos!

“Isto é que vai ser uma aventura!” Foi o meu primeiro pensamento. E não estava enganado. Tenho pena de não me lembrar do nome desse senhor, pois marcou os meus dois primeiros anos em Lisboa. Marcou-me especialmente no pescoço, e às vezes até nas orelhas… Isto porque, o homem não parava de fazer rir todo e qualquer cliente em quem pousasse os seus utensílios.

No meu caso para além das habituais piadas, acrescia o facto de eu ser do norte do país, razão pela qual ele ainda gozava mais, mas sempre sem ofender e sempre com uma piada incrível. Só por volta da minha terceira visita é que ele percebeu que eu era de Braga e não do Porto (ou seja, ainda mais a norte). Ao que ele retorquiu:

- Foda-se!!! Oh menino, diga-me lá… Lá na Corunha faz um frio do caralho! – A esta altura ele já tinha acabado de me por a bata e preparava-se para fazer provavelmente o único corte de cabelo que tive coragem de arriscar naquela barbearia. A conversa, essa, continuava, e eu acabava por lhe dizer:
- Para mouro, você usa as palavras todas… - dizia eu referindo-me aos palavrões por ele utilizados.
- Sabe que eu vou muitas vezes lá a Espanha. Corunha não foi que disse? – voltava ele à piada do início.
- Na minha terra espanhóis são os de Guimarães.
- Isso já não sei. Só sei que o Afonso Henriques, pegou na espada e fugiu de lá como o Diabo da Cruz…

A esta altura, ele encontrava-se já com a tesoura a trabalhar a todo o vapor. Também a esta hora eu podia soltar todas as gargalhadas que me apetecesse. Às vezes quando me ria demais, ele dizia-me para ter atenção ao calendário e não me mexer muito. O que, à medida que o tempo avançava se tornava cada vez mais difícil… Especialmente quando a conversa era de Futebol, pois como ele era do Belém era-lhe fácil gozar com os três grandes e não apenas só com dois.

O momento mais perigoso chegava quando ele pegava na navalha. Aliás, esta devia ser a táctica dele… Toda aquela sequela de piadas e anedotas, faziam parte de seu esquema perverso, ganhando a nossa confiança enquanto escolhia o sítio e o momento para aplicar o golpe final!...

Nunca mais esqueci um dos seus golpes que terá sido o golpe mais profundo que alguma vez recebi.

Uma tarde, depois das “piadas de tesoura” (já um pouco flagelado pelas sucessivas gargalhadas que levavam a minha cabeça contra a tesoura dele), e já na fase de afiar a navalha, em vez da preparação habitual para a gargalhada final, estranhamente e sem pré-aviso, começa a falar-me dos filhos. Em particular de um, que por razões de divórcio, não tinha visto crescer. Como sou filho de pais separados, a sua história deixou-me completamente enternecido.

Erro Fatal! Não passava de mais um dos seus esquemas. Eu devia ter desconfiado… ele estava a fazer pausas a mais com a sua navalha contra o meu pescoço. Foi então que de repente, ele achou o momento indicado. Enquanto me encostava a navalha, preparava o seu golpe num tom sério:

- Oh menino, mas porque é que as mulheres têm a mania que gostam mais do filhos do que os Pais. E vêm sempre com a mesma desculpa… “andei com ele na barriga 9 meses”! – Diz ele.

Foi então que encostando-se a mim de modo a poder sussurrar-me ao ouvido, desferiu o golfe final:

- Então não somos nós, os Homens, que os carregamos nos colhões uma porrada de anos?

Mais uma vez, uma das minhas gargalhadas levou o meu pescoço contra a navalha dele. Hábito do qual ele me estava sempre a acusar…
Confesso que tenho saudades “Do Barbeiro”, pois apesar dos cortes e arranhões, que saravam numa questão de dias, as suas sessões eram bastante terapêuticas!

segunda-feira, julho 31, 2006

Microchip

No meu primeiro ano como estudante universitário em Lisboa, como ainda não conhecia muita gente, amigos ou colegas, passava as tardes de fim-de-semana no café da minha rua.

Para quem não conhece, a 'Capucha', de seu nome, também conhecida pelos meus vizinhos por Sr. Carlos (que é o nome do dono), é uma típica tasca com esplanada e tudo! Ali tudo se sabe e toda a gente se encontra. Especialmente ao Domingo que é dia de futebol. E por incrível que pareça, nas tascas, velhos 'com os copos' podem ser bem piores que 'beatas de igreja'... Com a diferença que dão a qualquer conversa um ar sério e sabedor de todo e qualquer assunto que surja.

A título de exemplo, vou partilhar convosco esta pequena história. Estava eu uma bela tarde no Sr. Carlos a beber umas imperiais, enquanto esperava pelo jogo do meu Sporting Clube de Braga, e eis senão quando, aparece o 'Estrela'.

O 'Estrela' era bastante conhecido na rua. Tinha ar de 'carocho', ninguém sabia de onde vinha nem para onde ia. Certamente adepto de actividades duvidosas, mas que no caso dele ninguém duvidava. No entanto era um personagem querido de todos os que habitavam ordinariamente o café do Sr. Carlos.

O 'Estrela' já não aparecia há bastante tempo, pelo que foi motivo de alguma alegria vê-lo de volta e bem de saúde, na medida do possível no caso dele.

- Então 'Estrela', bons olhos te vejam! Por onde tens andado? - perguntou o Sr. Carlos
- Estive a passar férias na herdade de um amigo meu ali para os lados de Setúbal - respondeu o 'Estrela' com ar importante.

Foi gargalhada geral!
-Estiveste foi numa clínica de recuperação...- foi o comentário que, de entre outros, me ficou gravado na memória.

O 'Estrela', ofendido, retorquiu com ar sério:
- Estou a dizer a verdade! E digo mais: vi lá algum que nunca tinha visto antes que vocês nem sonham... - e contou-nos a história dele com um entusiasmo tal que ninguém foi capaz de o interromper - A herdade do meu compadre é enorme. Tem p'raí,... Kilómetros! E tem lá uns cães grandes também, lindos, pretos que andam à solta pelo terreno. A esta altura, ele faz uma breve pausa, como preparando-se para lançar uma bomba... - Mas o que me deixou doido, é que ele tem la um assobio, que por mais que se sopre não se ouve nada. Mas os cães vêm a correr. Vai buscá-la! - diz o 'Estrela' com o seu habitual ar de campeão.

A falta de reacção a esta história foi generalizada. Não sei se pelo fantástico desta história, se pela tamanha ignorância que fazia do 'Estrela' a pessoa mais feliz da rua... E quando menos se esperava, há uma voz que surge de rompante:
- Ah! Eu sei o que isso é. - afirma incontornavelmente um dos velhos e habitués da 'Capucha'. Era o ponto sem retorno. Ele iria mesmo explicar o que era o assobio?... Será que não percebe que iria destruir o momento vitorioso de 'Estrela'? - Isso é um Microchip!

O espanto e a curiosidade foi tal, que todas as pessoas cercaram aquele orador como se merecesse a Presidência da República.

- Aposto que os animais tinham umas coleiras fora do vulgar?...
Ao que o 'Estrela' confirmou:
- Sim. A modos que cheias de brilhantes e chapas metálicas. Eram grossas e tudo.
- E aposto que os animais iam sempre ter ao mesmo sítio?... - continuou o velho na sua tentativa de provar a sua teoria.
- Oh! O meu compadre ia a porta das traseiras e chamava-os e eles vinham.
- Ora cá está! - agora era o velho que envergava o mesmo ar de campeão vitorioso que roubara ao 'Estrela' - É como digo. Isso é um Microchip, que está na coleira do animal, que por sua vez tem um eléctrodo ligado ao cérebro do animal! O assobio, não é mais que aproveitar a energia eólica do sopro, para poupar pilha. Este assobio emite uma micro-onda via rádio, que por sua vez bate no Microchip, enviando um sinal ao cérebro através do eléctrodo. Obviamente que, depois, o animal tem de estar treinado para praticar uma determinada acção, neste caso, ir ter à porta das traseiras do seu compadre. - finaliza o homem já quase sem fôlego, levantando o copo de imperial para molhar a garganta depois de tão eloquente discurso.

Perante tal explicação o espanto foi geral. "É o progresso diziam uns"... O 'Estrela' só conseguiu dizer: "Ah pu** que o fod****"

Apenas uma dúvida resiste. Se os suspiros do 'Estrela' seriam pela explicação dada, ou pelo facto de ter perdido o estrelato depois da intervenção de tal sábio. O velho, esse, mais tarde confirmei que não percebe nada de ultra-sons!

Sofa amarelo

Antes de mais, aqui vai o porquê do nome deste Blog. E também um pequeno tributo à peça material mais marcante de toda a panóplia mobiliária que compõe a meticulosa decoração da minha casa! Embora não pareça, este título tem tudo a ver com o tema deste Blog.

O meu sofá amarelo tornou-se um verdadeiro mito urbano! Confesso que quando o comprei não estava preparado para o que ia acontecer...
Que belo sofá pensei eu, inocente.
Foi preciso o meu amigo Filipe, que morou comigo um semestre, descobrir que o sofá dava para 2,5 cambalhotas (lembras-te?) que eu descobri o potencial daquele sofá. E tem-se revelado um verdadeiro sucesso, fazendo inveja a qualquer individuo desprevenido que nele se sente.
A inveja é tal, que já me disseram: 'O meu sofá novo é melhor que o teu'. Mas depois vem a minha casa visitar-me com a mesma regularidade... podem ser maiores, mais modernos, mais retro, mas ainda está por aparecer o sofá MELHOR que o meu!
Vou-vos dar uns exemplos:

João Ricardo: é meu vizinho e mora no prédio ao lado do meu! Desde que o conheço, ou melhor, desde que ele conhece o sofá, já lá dormiu mais vezes que na própria cama! Às vezes a mãe dele liga-me de manhã preocupada e eu digo-lhe o mesmo de sempre... 'Adormeceu no meu sofá!'

Marmita: o meu amigo Carlos Simões também tem a sua afinidade para com este belo exemplar de mobiliário. Uma certa época de exames foi estudar para minha casa e acabou por ficar um mês a dormir no meu sofá! Dividíamos despesas e tudo...

Fragoso: este será talvez o melhor exemplo! Este alentejano de gema partilhou moradia comigo durante cerca de um ano. Havia noites em que quase discutíamos para ver quem ficaria a dormir no sofá! E normalmente, o primeiro a ter de ir mijar (que só acontecia por volta das 5h00 da madrugada por altura das tele-vendas) , era quem perdia a teima. O derrotado, saía da casa-de-banho, despedia-se com um arrogante 'boa noite' e dirigia-se para a cama de semblante desiludido, mas confiante que na noite seguinte haveria de ganhar!

Obviamente que não vou dar exemplos de raparigas, pois apesar de bem mais interessantes as suas histórias, já não fariam sentido neste Blog. Até porque ninguém adormece quando está no 'bem-bom'. Mas vos garanto que ficaram la até ao dia seguinte!

A 'Fifinha' será talvez a única que terá passado incólume de percalços no mirabolante sofá amarelo! Mas que gostava de o ter em casa não duvido.

Com tal mito residente e desvirtuado de preconceito, mas ao mesmo tempo possuidor de uma malícia extrema, que é capaz de derrotar o mais ávido e enérgico ser, acabo por sair derrotado na minha própria casa. Será que tenho mesmo amigos, ou é o sofá que os atrai?... De qualquer modo ainda bem que o tenho. Se aquele sofá falasse...